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quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Trilogia da Escuridão



Eu sei, ninguém aguenta mais falar de vampiros. Nos últimos tempos houve uma verdadeira avalanche deles em filmes, livros, séries de TV. Todo mundo querendo aproveitar o rastro do sucesso de Crepúsculo e fazer um pezinho de meia. Aí a gente pensa: já deu, né? Mas eu prometo que, para os vampiros dos quais vou falar hoje, vale a pena dar mais uma chance.

Pra começar, qual o seu conceito sobre vampiros? Mortos-vivos de pele pálida e gélida, misteriosos, cheios de sex-appeal e até mesmo um pouco românticos? Ou a coisa esquisita e purpurinada de Crepúsculo? Para ler a trilogia formada pelos livros Noturno, A Queda e Noite Eterna, esqueça tudo isso.

Os vampiros de Guillermo del Toro e Chuck Hogan não têm nada de charmosos nem de sedutores. São criaturas asquerosas, de pele ressecada e grossa como couro, com um apêndice no lugar da língua que se projeta a até um metro de distância e suga o pescoço da vítima. É. Nem presas afiadas nem olhar sensual. E pra eles você não passa de comida. Ele se apaixonar por você é o mesmo que você se apaixonar por uma vaca. Além do mais, o vampirismo, nesse caso, é causado por vermes que provocam uma infecção na corrente sanguínea e deixam a temperatura do corpo quente, como uma febre eterna, e podem ser vistos se movendo sob a pele. E se propaga não apenas pela ferroada, mas, se você ferir o vampiro, os vermes saem escorrendo pelo chão e podem entrar no seu corpo de qualquer jeito. Nojento. Como se isso não bastasse, os vampiros funcionam como uma colmeia, obedecendo a um Mestre e se comunicando telepaticamente. A única maneira de matar tais criaturas é com a luz ultravioleta, seja do sol, seja artificial. Tá bom ou quer mais?

A trilogia toda é muito bem construída. Não sobram pontas soltas nem argumentos falhos. O ritmo é veloz e os personagens, muito bem caracterizados e convincentes, embora um pouco óbvios (não sei se chamo de óbvios ou de clássicos). Tem o sábio que conhece tudo sobre vampiros e se assemelha a Van Helsing, do Drácula. Tem o bad boy cheio de energia que sai dizimando a vampirada. Tem o cientista que usa a razão. E, claro, tem um casal romântico e complicado, como não poderia deixar de ser.

O problema todo começa com um avião que chega a Nova York com todos os passageiros e a tripulação misteriosamente mortos. E vai ficando pior, bem pior. Não vou botar spoilers aqui, mas adianto que o negócio fica tão feio que inclui até um inverno nuclear.

Deu vontade de ler? Ainda tem um temperinho a mais. Os autores criaram, dentro da história, o Occido Lumen, um livro que deve entrar para o rol das obras fictícias que todo mundo gostaria de ler, ao lado do Necronomicon de Lovecraft, da Enciclopédia Galactica de Asimov e do Livro Vermelho de Tolkien. Só pra deixar a gente com água na boca.

Cogita-se que a história vire filme ou algo parecido, mas até agora não há nada confirmado. Aqui um teaser do primeiro volume, Noturno, no youtube.
http://www.youtube.com/watch?v=BTuJCqs2fRs

domingo, 18 de agosto de 2013

Os Últimos Soldados da Guerra Fria


 Acabei de ler hoje Os Últimos Soldados da Guerra Fria, de Fernando Morais (o mesmo autor de Chatô e Olga), que fala sobre as ações de espionagem entre Cuba e os Estados Unidos entre 1990 e o início dos anos 2000. O autor, claramente, toma partido: ele é pró-Cuba. O país é apresentado como vítima de conspirações orquestradas pela comunidade cubana que vive nos EUA (mas eu, que tenho mais de dois neurônios, não preciso engolir essa conversa assim, sem maiores ponderações), embora também tenha seus agentes na Flórida.
Na queda de braço entre os dois países não há bonzinhos, isso é sabido. Se, por um lado, há uma luta desproporcional entre a maior superpotência do mundo e uma pequena ilha comunista (hoje já não tanto) que tenta se manter viva depois da queda dos países da antiga Cortina de Ferro, por outro há, também, um embate entre uma democracia consolidada (tá, com inúmeros questionamentos) e uma ditadura que insiste em não largar o osso.

Ficamos conhecendo em detalhes eventos, personagens, datas e o contexto em que ocorreram. Tudo dando nomes aos bois: os nomes são reais, há fotos das pessoas citadas, há cópias de documentos, etc. Ficamos sabendo, por exemplo, que em Miami há diversas organizações anticastristas que funcionam legalmente, inclusive com registro junto às autoridades americanas (!!!), e que são sustentadas por cubanos que saíram da ilha e foram bem sucedidos financeiramente nos Estados Unidos. Assim, muitas delas dispõem de dinheiro para comprar aviões, armamento, contratar pilotos e agentes, bancar a produção de panfletos e outros materiais de propaganda ideológica. Também tomamos conhecimento de que em boa parte da América Latina funciona um mercado de terroristas mercenários, sem qualquer vinculação política ou ideológica, que por qualquer merreca topam ir a Cuba como turistas e soltar uma bomba.
Há passagens bizarras e até mesmo revoltantes, como as várias vezes em que os aviões dessas organizações invadem o espaço aéreo de Cuba e sobrevoam a capital, Havana, soltando panfletos contra Fidel Castro. E o que Cuba pode fazer? Invadir os Estados Unidos? Óbvio que não. Apenas espernear, denunciar à ONU e ficar por isso mesmo. Até o dia em que resolve abater dois desses aviões e a coisa complica.

O lado B da história é a ação dos agentes cubanos instalados em Miami. São pessoas vivendo com orçamentos apertados, tendo que trabalhar para manter o próprio sustento ao mesmo tempo em que se infiltram nas organizações para espionar. Entretanto, como falei no início, não há bonzinhos. Esses agentes não hesitam em constituir famílias nos EUA como parte de suas “atribuições”. Uma coisa calculada e planejada matematicamente e, desde o início, com prazo de validade: assim que cumprem as tarefas para as quais foram designados, abandonam esposa e filhos e voltam para Cuba sem sequer dar notícia. Algo absolutamente desumano. Também traem amigos, os parentes que ficaram na ilha e quaisquer pessoas que cruzem seus caminhos. São de uma frieza incrível.
O livro é rico em informações e em documentação, é uma pesquisa impressionante, porém por vezes se alonga demais em assuntos que poderia tratar resumidamente (Fernando Morais é prolixo, né? A gente já viu isso em Chatô). Há passagens que prendem a atenção, como a participação de Gabriel García Márquez como mediador numa troca de informações entre Cuba e a Casa Branca, e outras totalmente dispensáveis, como as longas descrições sobre a vida afetiva de alguns agentes. Enfim, indico para as pessoas que tenham realmente interesse no assunto e queiram aprofundar-se em detalhes.

Aqui o link do autor falando sobre o livro no Programa do Jô. Vale a pena ver.

sábado, 17 de agosto de 2013

Edições Anotadas Demais


De vez em quando eu compro umas edições comentadas de alguns livros de que gosto muito. Na minha cabeça, quando um livro é muito bom vale a pena saber mais e mais sobre seu conteúdo, aprofundar mais o assunto ou mesmo conhecer algumas curiosidades. Mas eu vou parar com essa mania. Algumas das minhas aquisições me mostraram que as edições comentadas podem não apenas não trazer nada de substancial que contribua com o prazer de ler o livro, como também podem tirar toda a graça. Vamos aos exemplos.

Eu sempre gostei (acho que como todo mundo) de Alice no País das Maravilhas. Tenho até uma edição em inglês, capa dura, com os desenhos da edição original. Aí achei boa ideia comprar uma edição anotada (essa aí do lado) que saiu há alguns anos. Não deveria ter feito isso. As anotações só me fizeram ver que não há como uma pessoa compreender perfeitamente Alice, a menos que tenha vivido na Inglaterra da era vitoriana, tenha assinado todas as revistas de que Lewis Carroll gostava na época e tenha lido (e compreendido muito bem) o poema Jabberwocky, também escrito por ele. Detalhe: o Jabberwocky é um poema nonsense, o que já dificulta tudo. Ou seja: comprei uma edição anotada só pra descobrir que não entendo nada de Alice. Além do mais, a edição é tão, mas tão, mas tão anotada que quase não há páginas sem comentários, e eles ocupam um terço do espaço. Podia ter passado sem essa (e, confesso, perdeu um pouco a graça).

Quer ver mais? Há muitos anos eu tinha começado a ler Rayuela (em português, O Jogo da Amarelinha), de Júlio Cortázar, e tinha gostado muito. Mas alguém passou a mão no meu livro antes que eu pudesse terminar. Aí, pouco depois, numa viagem a Buenos Aires, encontrei uma versão anotada e não hesitei em comprar, sem nem folhear. Decepção. A tal edição, pra começar, veio com uma introdução de 94 páginas e, ainda, uma bibliografia de referência. Peraí, né? 94 páginas de introdução? Claro que ignorei-as completamente e fui direto para o livro. Mas não adiantou. Praticamente a cada página tem uma nota de rodapé, explicando as minúcias das minúcias, uma coisa totalmente desnecessária. Exemplo: “pela primeira vez, o relato passa à terceira pessoa”. A não ser que você seja muito retardado, não precisa explicar que o relato passou à terceira pessoa, né? Tem outros absurdos, como uma nota explicando o que é a torre Eiffel. Genteeee!!!! Se a pessoa não tem uma informação dessa, desculpe, mas é semi-analfabeta e não tem nem condições de estar lendo o livro, pra começar. Larga Rayuela e vai ler Paulo Coelho. Como se não bastasse, ainda tem mais um detalhe: a história se passa em Paris, e o comentador, achando pouco, dá TODOS os endereços das ruas e dos locais por onde os personagens andam, e algumas vezes coloca até fotos delas. É chato. Mas muito, muito, muito chato.
 
Às vezes eu penso que algumas das pessoas que se encarregam de fazer os comentários dos livros só querem mostrar o quanto são “sabidas”, eruditas e o quanto entendem da obra. Só que botam tudo a perder, porque a única coisa que eu consigo pensar é no quanto devem ser chatas pessoalmente.