Acabei de ler hoje Os
Últimos Soldados da Guerra Fria, de Fernando Morais (o mesmo autor de Chatô e Olga),
que fala sobre as ações de espionagem entre Cuba e os Estados Unidos entre 1990
e o início dos anos 2000. O autor, claramente, toma partido: ele é pró-Cuba. O
país é apresentado como vítima de conspirações orquestradas pela comunidade
cubana que vive nos EUA (mas eu, que tenho mais de dois neurônios, não preciso
engolir essa conversa assim, sem maiores ponderações), embora também tenha seus
agentes na Flórida.
Na queda de braço entre os
dois países não há bonzinhos, isso é sabido. Se, por um lado, há uma luta
desproporcional entre a maior superpotência do mundo e uma pequena ilha
comunista (hoje já não tanto) que tenta se manter viva depois da queda dos
países da antiga Cortina de Ferro, por outro há, também, um embate entre uma democracia
consolidada (tá, com inúmeros questionamentos) e uma ditadura que insiste em
não largar o osso.
Ficamos conhecendo em
detalhes eventos, personagens, datas e o contexto em que ocorreram. Tudo dando
nomes aos bois: os nomes são reais, há fotos das pessoas citadas, há cópias de
documentos, etc. Ficamos sabendo, por exemplo, que em Miami há diversas
organizações anticastristas que funcionam legalmente, inclusive com registro
junto às autoridades americanas (!!!), e que são sustentadas por cubanos que saíram
da ilha e foram bem sucedidos financeiramente nos Estados Unidos. Assim, muitas
delas dispõem de dinheiro para comprar aviões, armamento, contratar pilotos e
agentes, bancar a produção de panfletos e outros materiais de propaganda
ideológica. Também tomamos conhecimento de que em boa parte da América Latina
funciona um mercado de terroristas mercenários, sem qualquer vinculação
política ou ideológica, que por qualquer merreca topam ir a Cuba como turistas
e soltar uma bomba.
Há passagens bizarras e até
mesmo revoltantes, como as várias vezes em que os aviões dessas organizações
invadem o espaço aéreo de Cuba e sobrevoam a capital, Havana, soltando
panfletos contra Fidel Castro. E o que Cuba pode fazer? Invadir os Estados
Unidos? Óbvio que não. Apenas espernear, denunciar à ONU e ficar por isso
mesmo. Até o dia em que resolve abater dois desses aviões e a coisa complica.
O lado B da história é a ação
dos agentes cubanos instalados em Miami. São pessoas vivendo com orçamentos
apertados, tendo que trabalhar para manter o próprio sustento ao mesmo tempo em
que se infiltram nas organizações para espionar. Entretanto, como falei no
início, não há bonzinhos. Esses agentes não hesitam em constituir famílias nos
EUA como parte de suas “atribuições”. Uma coisa calculada e planejada
matematicamente e, desde o início, com prazo de validade: assim que cumprem as
tarefas para as quais foram designados, abandonam esposa e filhos e voltam para
Cuba sem sequer dar notícia. Algo absolutamente desumano. Também traem amigos,
os parentes que ficaram na ilha e quaisquer pessoas que cruzem seus caminhos.
São de uma frieza incrível.
O livro é rico em
informações e em documentação, é uma pesquisa impressionante, porém por vezes se alonga demais em
assuntos que poderia tratar resumidamente (Fernando Morais é prolixo, né? A
gente já viu isso em Chatô). Há passagens que prendem a atenção, como a
participação de Gabriel García Márquez como mediador numa troca de informações
entre Cuba e a Casa Branca, e outras totalmente dispensáveis, como as longas
descrições sobre a vida afetiva de alguns agentes. Enfim, indico para as
pessoas que tenham realmente interesse no assunto e queiram aprofundar-se em
detalhes.
Aqui o link do autor falando
sobre o livro no Programa do Jô. Vale a pena ver.
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